Certo dia, após uma palestra em uma faculdade, fui tomar café com alguns professores. A cafeteria ficava próxima da entrada principal da instituição.
Em determinado momento, uma professora percebeu que tinha um visitante cujo comportamento denotava que estava perdido.
Ela pediu licença ao grupo e foi até a pessoa. Como estávamos próximos ouvi o diálogo. A professora perguntou em que podia ajudar, a pessoa queria uma informação básica, sobre onde ficava uma secretaria para resolver alguma pendência de matrícula ou algo assim. Prontamente, orientou-o como chegar até tal lugar. Ele agradeceu e saiu com uma expressão de segurança e satisfação.
Meus clientes são todos os clientes da empresa
Eu percebi nesta atitude da docente algo inusitado. Afinal, dentro de suas atribuições de professora daquela instituição, não se encontra a de dar informações para novos alunos.
Não resisti e lhe perguntei por que ela fez aquilo, já que não era sua obrigação aquele tipo de atendimento. Ela, muito educada, mas muito firme, respondeu:
— Claro que é, professor! Como sou da casa preciso atender bem todos os meus clientes.
Essa frase ficou reverberando na minha mente por um tempo. “Como sou da casa preciso atender bem todos os meus clientes.”
Minha percepção e conclusão é que ela se sentia mais que empregada da faculdade, mais do que professora. Ela se sentia “da casa”. Seus clientes não eram apenas os seus alunos, eram TODOS os clientes da empresa.
Visão de dono
Esse senso da minha colega era mais que o sentimento de pertencimento. Pois, sentir que fazemos parte de um grupo – que é importante – nos remete à organização desse grupo e o papel de cada um nele. O sentimento de pertencimento à uma igreja, por exemplo, não me gera a responsabilidade de substituir o sacerdote na sua falta.
Pensei: estou diante a tão falada visão ou sentimento de dono. Resolvi, então, dividir com ela e com o grupo essa minha descoberta. Fui, mais uma vez, surpreendido.
Ela deu um pequeno sorriso e, me chamando de professor, retrucou:
— Não creio que eu tenha a visão ou sentimento de dono desta faculdade. Aliás, não creio também que o dono dessa IES se estivesse aqui teria agido como eu. Imagino que ele não saiba nem onde fica a secretaria acadêmica e se “perderia tempo” com um novato.
Sou apenas uma profissional
Houve alguma concordância por parte dos seus colegas – deviam conhecer quem ela se referia – depois continuou:
— Minha atitude é apenas profissional. Sou professora dessa instituição e, consequentemente, meu nome está vinculada a ela. Tudo que lhe acontece me diz respeito e se eu souber como e puder, vou ajudar.
Atitude de dono?
Ownership ou atitude de dono é o desejo de toda e qualquer organização. Afinal, ter colaboradores que sacrifiquem seu tempo, sua saúde e sua energia, às vezes, até os seus relacionamentos, em prol do sucesso da empresa, é o sonho de todo empresário. Pois é o que ele faz.
Você vai até encontrar no mercado livros e técnicas de como desenvolver essa atitude nos funcionários. Entre eles encontrei uma lista de características do profissional com atitude de dono. Segue algumas:
- Tem interesse pela história da empresa;
- Demonstra interesse por outras áreas da organização que não a sua;
- Apresenta vontade de estudar, aprender técnicas e executar tarefas que não estejam dentro de seu job description;
- Sugere novas ideias sem esperar sua implementação imediata;
- Quando percebe que ocorre algo incorreto fora de sua área, não hesita em ajudar;
- Está aberto para escutar novas ideias;
- Não se abate facilmente com erros e fracassos;
- Deseja que a empresa prospere;
- É automotivado.
Ownership ou Accountability
Se você reler novamente essa lista, tenho certeza de que vai perceber algo que percebi. Ou seja: nenhuma dessas características é exclusiva do dono ou de quem não é, mas tem a atitude de.
A professora do início da nossa conversa apresentou um desses atributos e não se sente dona da instituição. Ela afirmou que era apenas uma profissional. Se precisássemos lhe dar um rótulo diria que ela é uma profissional com accountability.
Optei pela expressão em inglês por entender que a tradução por ‘aquele que presta conta’ ou por ‘responsabilidade’ não exprime tudo o que quero falar.
Um profissional responsável cuida da sua tarefa, foca no seu papel e no processo necessário para atingir o seu objetivo.
Já um colaborador com accountability é orientado pelos resultados, foca na boa execução das tarefas definidas como necessárias ao atingimento do objetivo e compromete-se com o resultado.
Você é dono de que?
Portanto, você pode ter todas aquelas características citadas acima – que são desejadas pela organização – sem precisar se sentir dono e se sacrificar por algo que não é seu.
Há poucos motivos na vida que merecem a nossa imolação e a empresa do seu chefe não é um deles.
Empreste boa parte do seu talento, da sua energia e do seu tempo à sua organização, mas lembre-se, sempre, que você é realmente dono é da sua saúde e da sua felicidade. E dedique-se a você e aqueles quem importa.