Para meus colegas profissionais de Recursos Humanos
Recentemente um aluno me fez a seguinte pergunta: considerando que um dos papeis da área de gestão de pessoas é ser advogado dos funcionários, podemos afirmar, então, que essa dimensão, devido ao seu caráter extremamente subjetivo, prescindiria de processos padronizados?
“Advogado dos funcionários”?
Antes de responder à pergunta é importante registrar que falávamos do modelo de múltiplos papéis dos Recursos Humanos. Esse conceito aparece no livro de David Ulrich, “Os campeões de recursos humanos: inovando para obter os melhores resultados”.
O autor defende que para os profissionais de RH adicionarem valor a empresas cada vez mais complexas, precisam desempenhar papéis também cada vez mais complexos e, às vezes, até mesmo paradoxais. Os profissionais de RH devem assumir papeis operacionais e ao mesmo tempo estratégicos.
Precisam ser ao mesmo tempo polícia e parceiros. Assumir a responsabilidade tanto por metas qualitativas quanto quantitativas no curto e no longo prazo. Partindo dessa premissa apresenta quatro papeis essenciais para a área:
- Parceiro do negócio (Business Partner – BP);
- Administrador da estrutura organizacional;
- Gestor da transformação e da mudança; e
- Advogado dos funcionários.
Nesse último papel, o RH cuida da motivação, dos conflitos interpessoais, das demandas diversas, da saúde entre outras. Daí a pergunta do aluno.
Para responder contei duas histórias que aconteceram em uma empresa que trabalhei.
Cuidado com o que você fala
Um funcionário que havia perdido o seu cargo em virtude de uma reestruturação procurou a área de gestão de pessoas. Ele queria reclamar que o processo de escolha dos funcionários que ficariam ou sairiam do departamento. Acreditava que foi malconduzido pelo seu gerente.
As instruções da organização para essa situação rezavam que a área de RH deveria se disponibilizar para agenciar a realocação do colaborador, acolher a sua denúncia e apurar se o processo foi feito dentro das normas.
Entretanto, nesse acolhimento o gerente de RH se sensibilizou com a história (o que por si só não é nenhum problema) e transcendeu as normas chegando a concordar com o demandante em alguns aspectos da sua reclamação.
Quando saiu dali o empregado acionou a justiça e alegou que até o executivo de gestão de pessoas também concordava com ele. Não preciso detalhar o tamanho do prejuízo e o desgaste que isso causou.
Cuidado com o que você escreve
Outro caso: um empregado fora vítima de um assalto durante o serviço. Nessa situação, além de toda assistência médica e jurídica, a empresa realoca o funcionário em outra unidade, caso haja indicação formal da área de saúde ou de segurança.
No caso em tela, não havia sido emitido parecer das áreas responsáveis para a transferência do funcionário. Considerando que era a segunda vez que ele passava por essa situação, a área de gestão de pessoas começou a fazer gestão para a sua realocação.
Entretanto, o tempo começou a passar sem que a transferência fosse efetivada. O empregado começou a cobrar com veemência uma solução para o caso, através de vários canais, inclusive e-mails.
Quando sua paciência chegou ao limite, o colaborador denunciou o setor de RH à Ouvidoria Interna, anexando e-mails onde a área informava como estava o processo. Isto é, a área de gestão de pessoas teria concordado, através de suas ações, que a demanda do empregado era legítima. E quando ela faz isso é a empresa que faz.
O processo protege a todos
Em ambos os casos, o descumprimento do processo trouxe prejuízos à empresa (aumento de custos, funcionários insatisfeitos, desgaste da área etc.). Entretanto, os demandantes também foram muito prejudicados. Aquele, por não ter sua demanda acolhida pela justiça, além de esperar um tempo mais que razoável para o seu resultado. Esse, porque a partir da constatação que não fazia jus a sua realocação foi indeferida.
O pior, a área de gestão de pessoa foi a mais abalada, pois perdeu credibilidade com os funcionários, com os gerentes de linhas e, até mesmo, com a área estratégica.
Processos de RH: segurança da empresa e dos funcionários
Os processos da área de Gestão de Pessoas são construídos com base na experiência e visam atender os objetivos organizacionais, conciliando os interesses dos funcionários, e minimizando os riscos, inclusive os legais.
Eles não têm a pretensão de prever todas as situações, mesmo porque as pessoas são imprevisíveis. Entretanto, na própria norma deve prever alçada para se resolver casos excepcionais.
Assim, gestão de pessoas precisa de processos, sim. Mesmo quando investida no papel de advogada dos funcionários. Afinal, somos uma área da empresa e como tal é imprescindível que tenhamos processos claros e justos. Ganha a organização e ganha o funcionário.