Tenho uma poesia com esse nome. Naquele momento usei a palavra no sentido que eu conhecia: “a arte da poesia” ou “faculdade poética”. Vim a saber depois, poiesis, de origem grega, significa antes “ato de criação”, “ação”, “confecção”, “fabricação”. Cortella[1] define poiesis como minha obra, aquilo que faço, que construo.
Uma vez vi uma escultura em que a própria se esculpia. É isso que somos. Seres em construção. Não nascemos prontos e não estamos prontos. E qual é o nosso cinzel?
Primeiro o que não é
Você não cria a si mesmo nos momentos de lazer e entretenimento. Não que eles não sejam importantes. O recreio da escola, o intervalo do jogo e o final de semana. Tudo isso é fundamental para que o corpo e a alma se equilibrem.
Entretanto, quando começamos a achar que o recreio é mais importante que a aula cometemos um grande equívoco. Qual o grande jogador que se notabilizou ou fez uma grande jogada no intervalo? Que grande conquista humana aconteceu em um momento de ócio?
Nossos cinzel e martelo é o trabalho
Nosso cinzel e o nosso martelo não é a praia, não é a balada. É o trabalho. E como disse Gonzaguinha, bebendo na poesia de Maiakovski:
E o que dizer de alguém que espera o final de semana para ser feliz? Se ele passa cinco dias da semana, que representa mais de 70% dos dias de um ano, sem construir nada, sem servir ao outro, sem melhorar a si mesmo, que tipo de felicidade ele terá nos dias de ócio?
O trabalho nos constitui
O trabalho como um sacrifício ou tortura é uma criação ideológica da nobreza que vivia de explorar o trabalho dos vassalos. A Revolução Industrial veio dar um novo significado ao trabalho. E, creio, que a melhor definição é “poiesis”.
Na sua teoria, Maslow identifica a necessidade de autorrealização como a mais importante para o ser humano. Ora, a autorrealização nada mais é do que a nossa própria construção. É o trabalho que nos constitui.
Alguém poderia afirmar: eu posso me realizar fora do trabalho. Não é verdade. O que você pode fazer é se realizar fora do seu emprego (aquela atividade que te dar sustento) e nas poucas horas vagas que te sobrar você terá que desenvolver outra atividade (trabalho), mesmo que não remunerada, para se sentir totalmente realizado.
O nosso emprego pode ser o nosso trabalho
Ora, se podemos reunir em uma única atividade o emprego (que sustenta as nossas necessidades fisiológicas e de segurança e contribui para suprir nossas necessidades de relacionamento, amor e estima) e o trabalho (que nos permite nos tornarmos aquilo que podemos ser), por que fazer isso em dois momentos?
Esse equívoco de que nos realizamos fora do trabalho gera estresse desmedido e a busca desenfreada para sermos felizes nos finais de semana. Quando ouvimos a música do “Fantástico”, no domingo à noite, percebemos que não estamos tão felizes assim. E a segunda-feira que se avizinha vira um suplício.
[1] Mario Sergio CORTELLA; Qual é a tua obra. Editora Vozes, 2007.